quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

A FELICIDADE


A FELICIDADE E OS MITOS

Um dia, Deus e os anjos se reuniram e decidiram criar um homem e uma mulher.
Planejaram criá-los à sua imagem e semelhança.
Então, um deles disse:
- Esperem! Se vamos criá-los à nossa imagem e semelhança, irão ter um corpo igual ao nosso, força e inteligência igual a nossa!
Devemos pensar em algo que os diferencie de nós, senão estaríamos criando novos deuses. Devemos tirar-lhes algo, mas o que poderíamos tirar?
Depois de muito pensarem, chegaram à conclusão que deveriam tirar-lhes a FELICIDADE, mas o problema era onde escondê-la para que nunca a encontrassem.
Então começaram a discutir...
- Vamos escondê-la na montanha mais alta da Terra!
- Não te recordas que demos força a eles? Alguém conseguirá subir até o topo desta montanha e saberão onde ela está.
- Então vamos escondê-la no fundo do mar!
- Também não seria um bom lugar, pois lhes demos inteligência e alguém certamente vai criar alguma máquina que os fará submergir e encontrá-la.
- Quem sabe, possamos escondê-la em um planeta bem distante!
- Também não seria eficaz, pois lhes demos a curiosidade e a ambição, portanto, irão querer ultrapassar limites e logo criarão algo para voar pelo espaço e certamente a encontrarão.
Depois de muito discutirem e não chegarem a nenhuma conclusão, o único anjo que não havia falado, pediu a palavra e disse:
- Creio que sei onde poderemos colocar a FELICIDADE em um lugar que eles nunca descobrirão!
Todos ficaram espantados e lhe perguntaram:
- Então nos diga, onde???
E ele respondeu:
- Colocaremos a FELICIDADE dentro deles, pois estarão tão preocupados buscando-a fora, que nunca a descobrirão.
Todos ficaram de acordo e desde então tem sido assim:
O  homem passa a vida toda  buscando a felicidade sem saber que a traz consigo...{ http://www.encantosdasereia.com.br/felicidade.htm}
Inciei esse texto com essa lenda e história. Ela ilustra o que nem sempre se explica de modo completo e acabado. Há algum tempo escrevi o meu primeiro blog sobre o sentido do BLOGAR, fazer BLOGs. Fazer blogs não é falar de si de modo insignificante. É falar sensatamente de um tema refletido e amadurecido. Não é qualquer comunicação. É falar, é estabelecer rede, redes de significados. Se eu acredito que tudo o que comunico faz redes... Imagine que rede é essa que não tece nada e não tem consistência, é inconseqüente? Se eu comunico qualquer coisa o meu interlocutor (ou interlocutores) banalizará o que é comunicado e a partir disso todos os blogs são qualquer coisa menos nada. Fazer um blog não é dizer o óbvio, o que é do usual senso comum, mas é partir dos fenômenos, do banal e dar uma feição filosófica ou científica. Blogar é dar sentido ao usual e dele criar insights com sabedoria e sobriedade intelectuais. Essa é uma das funções do ato de educar.
Por que eu fiz toda essa introdução? É que eu vou colocar na arena da rede poliamorista uma coisa, tema que todo mundo pensa, sabe, acha que é importante, mas que ninguém arrisca dizer que sabe o que é, o que pensa e vive sobre e por que é importante. Vou tecer palavras sobre a FELICIDADE, a partir de uma lenda, de um mito sobre a felicidade. É comum escutar as pessoas dizerem que cada um tem o seu modo de ser feliz. Isso tem sentido? - Claro que não. A felicidade tem suas nuances, conquistas e racionalidades.
O mito é uma referência eterna e interna para os humanos. Ela está dentro e fora de nós. É um arquétipo, no dizer de JUNG. O homem é um ser mitológico. O mito é uma narrativa, uma história, uma metáfora, uma alegoria. Ele foi inventado pelos antigos que através dessas histórias projetavam seus sonhos, ideais, desejos. Os mitos foram criados para que se espelhassem neles os homens e fossem os inventores de suas vidas. A referência disso é a grande obra clássica de HOMERO: ILÍADA E ODISSÉIA. Essa obra é a trama que tem como enredo a hipotética guerra de Tróia. O que se quer transmitir nessa história, entre gregos e troianos, não é se houve ou não essa suposta guerra, mas a relação necessária, idealizada, entre os homens e os deuses que acontece nessa. Um não vive sem o outro.
Nos mitos aparecem sempre a TIPO (LOGIA) e o ANTITIPO (LOGIA) dos HUMANOS. No caso protagonizado estão Odisseu ou Ulisses e Penélope. Nos mitos existem mortais, heróis e deuses. O modelo ideal de homem está nos heróis. Buscam-se os valores e as virtudes dos heróis. As virtudes mitológicas é o resultado de um trabalho e de uma labuta humana (HESÍODO).
Esse é um tema caro e dileto para a filosofia desde as suas origens. Todos a buscam e ninguém sabe onde a encontrar. Ninguém é feliz sozinho, mas por outro lado só quem consegue ficar sozinho é feliz. Vivemos em uma sociedade de consumo. As pessoas se consomem e consomem-se umas às outras. E consumir aqui tem uma conotação negativa. O consumo é um ato nobre do ser humano.
Quando GAARDER esteve no Brasil, para lançar o seu célebre livro O Mundo de Sofia foi entrevistado na TV cultura sobre o seu livro. Ele falou da hipostasiada ascensão da filosofia. Na entrevista lhe foi feita uma pergunta sobre o que seria a felicidade. Ele respondeu que poderia falar dos valores reais da sociedade atual. Ele indicou quatro valores que a partir deles tecerei essa trama da felicidade. Penso que a felicidade está relacionada com os valores reais que temos em nossas vidas. Quem tem valores reais é feliz? Que valores são esse?
1. O CORPO: quem tem valores reais cuida bem de sua morada. O corpo é a morada do ser. Ele não é fonte ou cela da alma e do pecado. É através do corpo que nos comunicamos e recepcionamos aos outros. Nesse sentido é que HIPÓCRATES, o criador da medicina, dizia que quem tem um corpo são, tem uma mente sadia.
2. RELAÇÃO ERÓTICA: quem hospeda valores estabelece relação com os outros sem transformá-los em coisa, sem os consumir. A relação interpessoal livre, aberta, democrática e de confiança simboliza que a pessoa sabe tecer rede de relações saudáveis com os outros. Isso significa que toda relação é uma micro-relação de poder. (FOUCAULT) Da casa grande à senzala (FREIRE), do espaço familiar ao espaço profissional, do espaço educativo ao espaço político representativo. São todas Relações de igualdade ou de dominação.
3. AMIZADE: quem tem valores tem amizades. Nessa perspectiva a amizade é o outro fora de mim. É o meu eu hospedado no outro. O meu eu se faz, se renova, se inventa na relação como o outro. Ninguém faz ninguém feliz, mas por outro lado ninguém é feliz sozinho. É feliz quem tem amigos. Quem é feliz tece rede de relações
4. ECOSOFIA: hoje quando se sabe que alguém agride uma criança ou espanca uma mulher é natural ficar indignado. Por que será que não temos a mesma atitude quando assistimos alguém ferir, destruir ou poluir a natureza e todo o ambiente de vida? Uma relação com a casa maior de todos e de ninguém se faz necessário. Temos que nos enredar e sentir que o planeta terra é a nossa morada. A natureza não nos pertence nós é que pertencemos e estamos nela inseridos. Ela é morada de todos e de ninguém. É morada de quem já viveu de quem vive e de quem nela virá.
A felicidade pode ser entendida como é narrado na história: outro planeta, no fundo do mar, no mais alto das montanhas e dentro de nós. A natureza ou Deus, segundo a religião, deu aos humanos esses valores. Através da força, da inteligência, da curiosidade e da ambição criaram a ciência e as TECNOLOGIAS que facilitassem essa busca incessante e ininterrupta. Essa navegação horizontal, vertical, interior, ética e política pode ser aprendida e ensinada ? É uma questão ética.
É por isso que os livros de auto-ajuda são contraditórios. Não existe auto-ajuda sem inter (conexão)-ajuda macro-ajuda, eco-ajuda, rede de ajudas. Essa literatura apresenta pílulas de auto-ajuda. É o que se chama de PORNOGRAFIA LITERÁRIA. É a felicidade da sociedade de consumo. Acesso sem intermediários e sem mediações.
Quando se fala que a educar é mais do repassar conteúdos. Isso foi feito a vida toda e continua sendo feito equivocadamente. Isso pode soar meio escandaloso e assustador para os paradigmas de muitos. Não tem saída para além das: redes de aprendizagens, redes de navegação, redes de construção do conhecimento, redes de redes, redes de internet, redes familiares, redes políticas. Seria buscar e fazer educação em outro planeta, no mais alto das montanhas, nas profundezas do mar ou uma suposta interioridade ou subjetividade solitária. Deve ser povoada a educação de conexões e redes, de viagens e navegações, de aventuras e descobertas insólitas. A relação só será justa quando formos justos nas relações: comigo, com os outros e com o ecossistema.
As gentes se humanizam através da educação. Ninguém nasce humano mais se torna humano o tempo e em todo o tempo. Educar é ensinar a humanizar-se a cada alvorecer e anoitecer. Educar é ensinar que a felicidade não é ter, possuir ou simplesmente como se tornou jargão comum da filosofia, Educar é ensinar a pensar e ARTIFICIAR, de artes, os caminhos da felicidade que passam pelo cuidado consigo, CORPO e RELAÇÕES, com os outros, AMIZADE, com o mundo, ECOSOFIA. Cuidar significa saber INVENTAR redes que me levem para ALÉM do bem e do mal (NIETZSCHE).

Raimundo Expedito PIres, PARAISO DO TOCANTINS, Janeiro de 2010 < virtualpoli@hotmail.com >

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